Meu primeiro blog vai ser sobre POESIA em geral. Admiro os grandes poetas: Mário de Andrade - Carlos Drumond de Andrade - Oswald de Andrade - Mário Quintana - Cora Coralina, e outros que citarei depois. Também gosto de produzir poesia, relacionada à minha vivência, à minha família e aos assuntos que me interessam.
segunda-feira, 11 de maio de 2020
SAUDADES
Um dia se amanhece saudosa.
Saudosa, mas não triste!
É um desses momentos em que nos propomos a fazer a contabilidade “deve-haver” da vida.
E as lembranças assomam: muitas, boas; algumas, nem tanto. E essas, nós empurramos para as sombras da memória.
A infância era pobre, hoje se sabe, mas não significava sofrimento ou carência.
Pequenas coisas davam alegria: Os cafés-com-leite. Pouco leite e pouco pão. Doces caseiros deliciosos.
Os almoços e jantares simples: arroz e feijão, aves, legumes, verduras e frutas do quintal.Eventualmente, havia carne bovina, assada aos
poucos na panela. Umadelícia, complementada com batatas douradas.
O feijão era cozido lentamente a cada dia, no caldeirãozinho próprio, no fogão a carvão.
Sem geladeira – não havia eletricidade – a comida feita diariamente, era saudável e saborosa.
Para ir à escola andava-se muito, à beira de córregos ladeados de vegetação e flores silvestres.
Caminhava-se quase uma hora com a irmã e as amiguinhas, até outro bairro distante.
A escola, numa casa adaptada, era mobiliada com compridas mesas e bancos que as acompanhavam.
Os alunos sentavam-se lado a lado.
O professor, dizia-se, era “alemão” e se chamava João Waldman. Era um senhor de pele avermelhada e cabelos claros.
Ele dividia a classe em duas séries.
No nosso horário, funcionavam a segunda e a terceira séries.
O professor trabalhava ao mesmo tempo as duas séries, na lousa repartida ao meio.
Em um ano, podiam-se completar essas duas séries. Eram os anos quarenta.
Os uniformes, simples, eram feitos de sacos de farinha de trigo. As saias eram tingidas com a tinta “Guarany”, e ficavam de um azul-marinho desbotado.
As pregas soltas, não tinham bom caimento.
As blusas brancas eram do mesmo tecido e tudo era feito no maior capricho, pela nossa mãe.
Nos pés, sandálias de solados de pneu.
Em casa usavam-se tamancos de madeira. O couro da parte de cima era enfeitado com florezinhas pintadas.
No dia a dia as crianças andavam, mesmo, descalças no quintal de terra.
A mala para a escola era uma caixa feita pelo nosso pai, com madeira fina e um suporte de tecido para ser carregada ao ombro. Como pesava!
Na casa do botão da blusa, a borracha redonda, era pendurada pelo furo central em um barbante, para que não fosse perdida.
Levava-se um tinteiro redondo, pequeno com rolha de cortiça e contendo tinta azul.Havia também tinteiros com tinta vermelha, pouco usada.
Uma caneta fina de madeira, às vezes decorada com uma pintura colorida e com uma pena de metal, acompanhava o tinteiro.
A cada poucas palavras, devia-se emergir a caneta no tinteiro, porque a tinta se acabava logo. A pena era trocada constantemente, pois se
estragava com facilidade.
Para secar a tinta da escrita, era usado o “mata-borrão” verde, de um fino papelão absorvente para ficar, assim, um trabalho escolar bem limpo.
Um dia, uma das amiguinhas não conseguiu abrir o tinteiro e empurrou a pequena rolha para dentro.
A tinta transbordou, espirrando pela sua blusa branca e seu rosto. A menina chorou muito e voltou para casa se escondendo atrás da sua maleta escolar. Pequenos acidentes que não se esquecem.
A meio caminho para a escola, parava-se na casa de outra amiguinha. Ela era filha única e tinha um lindo uniforme de casimira azul-
marinho.
A amiga era bem calçada e bem penteada, com longas tranças douradas. Linda!
Um retrato antigo evidencia a diferença das roupas e calçados, mas, isso não nos incomodava.
No mato que rodeava as casas da vizinhança e o caminho para a escola, havia frutinhas e muitas flores silvestres.
De uma erva chamada “arranca-toco” era feita uma infusão muito amarga, que depois de se beber um pouco, era colocada em grande
quantidade, numa bacia enorme no meio do quarto e se tomava um banho de imersão, bem quente.
Curava a dor e a febre e sarava-se com isso.
De vez em quando, a mãe das crianças as levava ao médico homeopata.
Ele segurava a mão das doentinhas, olhava nos seus olhos e descrevia o que tinham.
Depois, receitava uns glóbulos brancos em vidrinhos, que eram tomados religiosamente e assim também, eram curadas as pequenas moléstias.
Isso tudo há mais de sessenta anos! Nos anos 40.
Onde? Nos grotões do Brasil?
Não! Num bairro de São Paulo – SP – Vila Formosa – hoje tão pertinho de tudo.
A vida seguiu seu curso:
Lutas, perdas, vitórias, conquistas e o saldo é positivo!
Que bom!
E aí, estamos nós na frente da casa da amiguinha "rica" Cedenir Kmaradet, na Avenida Dedo de Deus, ainda só um brejo.
Ela é a menina de saia escura. Ao seu lado, A Ada Veroneze, ambas falecidas, mais a Maria Aparecida Martins, a Nazarina, minha irmã e eu.
Nós quatro morávamos na antiga Rua 72, na Vila Formosa, perto do chamado "Buraco Quente".

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